Veneza e Gênova dominaram o comércio mediterrâneo na Baixa Idade Média, no chamado Renascimento Comercial. A Europa feudal, em colapso, via crescerem os pólos comerciais, as feiras, o renascimento das cidades, o retorno do uso da moeda, a busca do lucro individual e o surgimento de atividades financeiras, nas quais o dinheiro era a mercadoria para ganhar dinheiro. As famílias Médici, florentina, e Függer, alemã, são exemplos do enriquecimento proporcionado por atividades mercantis e bancárias.
A partir do século XV, com as grandes navegações oceânicas, o eixo econômico deslocou-se para o Atlântico-Índico. O Mediterrâneo minguava comercialmente, arrastando as cidades italianas tão poderosas até então. A tomada de Constantinopla pelos turcos, em 1453, e a chegada de Vasco da Gama a Calicute, em 1498, foram o golpe mortal na supremacia histórica do comércio mediterrâneo.
Portugal e Espanha dividiram o mundo e nasciam os grandes impérios coloniais. Os ibéricos, mergulhados na ideologia católica da Contrarreforma, perseguiram e expulsaram judeus. Com eles, o capital móvel de Portugal e Espanha migrou para lugares mais tolerantes, notadamente para a Holanda.
A Holanda estava em guerra contra os Habsburgos do Sacro Império e da Espanha. Mas aproximou-se de Portugal, com o qual formou a associação luso-flamenga, fundamental para a montagem da empresa açucareira do Brasil, financiando, transportando, refinando e, principalmente, distribuindo o açúcar brasileiro no mercado europeu. Assim, a Holanda ficou com a maior parcela dos lucros gerados pelo produto da colônia portuguesa. Tinha, então, a supremacia do comércio Ocidental.
A União Ibérica (1580/1640) e o embargo do açúcar brasileiro por Felipe II da Espanha não acabou com a supremacia holandesa. Ao invadir o Brasil, passou a produzir aqui, com financiamento de uma empresa de capital misto, a Companhia das Índias Ocidentais.
Mas, a Revolução Puritana na Inglaterra, através do Ato de Navegação (1651) de Oliver Cromwell, interrompeu a hegemonia batava e iniciou a supremacia britânica. Fazem parte desse processo os tratados assinados entre Portugal e Inglaterra pelo apoio desta na luta pela Restauração do trono português. Portugal perdera, então, parte de seu império ultramarino, como as Ilhas Molucas e o Ceilão para a Holanda, Tanger e Bombaim para a Inglaterra. Em 1703, Portugal assinou, com a Inglaterra, o Tratado de Methuen, também conhecido por “Tratado dos Panos e Vinhos”. Enquanto existiu, o ouro brasileiro sustentou os constantes déficits da balança comercial portuguesa ou, como diz um autor, “o ouro do Brasil entrava pela porta de Portugal e saía pela janela”. Ou, ainda, “o ouro provocou buracos na Brasil, altares em Portugal e máquinas na Inglaterra”. A Revolução Comercial, com a exploração das colônias, o tráfico negreiro, a pirataria e a ação corsária, forneceu capital para a Inglaterra liderar a Revolução Industrial.
A Inglaterra consolidou-se como centro dinâmico do capitalismo industrial, em detrimento de outros reinos europeus ancorados no monopólio comercial exercido sobre áreas periféricas. Mas a produção fabril, em larga escala, não admitia mais a manutenção de mercados enclausurados pelos dogmas mercantilistas. Na primeira metade do século XIX desmoronavam os impérios ibéricos e a América Latina deixou de ser periferia do capitalismo comercial e passou a ser periferia do capitalismo industrial britânico. O liberalismo econômico derrotara o mercantilismo, mas aperfeiçoava a divisão internacional do trabalho, iniciada pelo regime do pacto colonial das antigas metrópoles.
A partir da metade do século XIX, com os efeitos da chamada Segunda Revolução Industrial, o neocolonialismo e o imperialismo escrevem uma nova história na África e na Ásia. E a Inglaterra confirma sua hegemonia no capitalismo monopolista, discursando sobre as “vantagens” do liberalismo. A Guerra dos Sipaios na Índia, as Guerras do Ópio na China e a Guerra dos Bôeres na África do Sul são inquestionáveis demonstrações da força dos canhões britânicos, em nome do “liberalismo econômico”. Vejamos o que diz um estudioso do imperialismo britânico: “O domínio britânico sobre o equilíbrio de poder europeu foi suplementado e complementado pela consolidação do império territorial da Grã-Bretanha na Índia, depois do chamado Grande Motim de 1857 [Guerra dos Sipaios, palavra de origem híndi (shipahi) que significa soldado].
O controle sobre a Índia significava comandar recursos financeiros e materiais – inclusive recursos humanos militares – que nenhuma nação ou conjunto provável de nações poderia igualar e nenhum grupo dominante, de momento, poderia desafiar em termos militares.
[...] Ao mesmo tempo, o regime britânico unilateral de livre comércio [liberalismo econômico] ligou o mundo inteiro à Grã-Bretanha. Esta se tornou o “mercado” mais conveniente e eficiente para obter meios de pagamentos e de produção e para colocar produtos primários. [...]Além disso, como em todos os ciclos sistêmicos de acumulação anteriores, a intensificação das pressões competitivas acarretada pela fase de expansão material associou-se, desde o início, a uma grande guinada do comércio e da produção para as finanças, por parte da classe capitalista britânica. A segunda metade do século XIX caracterizou-se não apenas por grandes levas de exportação de capital da Grã-Bretanha, como já foi assinalado, mas também pela expansão das redes bancárias provinciais britânicas, aliada à crescente integração delas nas redes de City, o centro financeiro londrino”.
(ARRIGHI, Giovanni. O Longo Século XX: Dinheiro, Poder e as Origens do Nosso Tempo. São Paulo. Contraponto/UNESP, 1996)
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