terça-feira, 29 de julho de 2014

VIAGEM A CUBA

  
  A voz anunciou o pouso em Havana, tempo bom, temperatura elevada. Para nossa surpresa, aplausos, muitos aplausos, aos quais juntamos os nossos.

     Já no taxi, a explicação do motorista:

     - Sim, o aplauso acontece sempre que companheiros cubanos voltam para casa, voltam para a pátria! - Assim começou nossa visita a Cuba.

     No caminho, até o centro de Havana, muitos cartazes, no Brasil chamados de outdoors. Não vendiam tênis, nem batom. Também não anunciavam lançamentos de edifícios de apartamentos, nem de escritórios. Exortavam a Revolução. Por todos os lugares pelos quais passamos, por todas as estradas, por todas as cidades e pequenos povoados, cartazes sobre a Revolução.

     Nossa hospedagem foi em casas de famílias. Em Havana, ficamos em duas delas, outra em Santa Clara e outra mais em Trinidad. Foi importante essa opção, para conhecermos as pessoas, o que fazem, o que pensam, como vivem. Pode haver artificialidade, mas não como são os hotéis, com seus gerentes, seus copeiros, seus porteiros, seus camareiros. Na casa, todas as funções são feitas pelas pessoas da própria família.

     Especialmente em Havana, entre a rua e a casa não há fronteiras, apenas paredes. As pessoas ficam nos balcões ou mesmo na rua, na porta das casas, conversam, discutem, cuidam dos filhos, seus e dos outros.

     Nos edifícios mais antigos – e, quase todos, são muito antigos – a fachada mal tratada esconde um interior surpreendentemente grande, com azulejos decorados nas paredes. Janelas, azulejos e móveis nos remetem aos anos 50 ou 60 do século passado. Com certeza, no mesmo endereço (ou dirección, como eles dizem) havia apenas uma família, antes da Revolução. Hoje, duas ou três compartilham o espaço e ainda é possível hospedar e servir turistas.

     Nas ruas, bicicleta, bicitaxi, cocotaxi, mototaxi, taxi antigo, taxi novo, carruagem puxada por cavalo, ônibus antigo, ônibus novo e carro novo convivem na turbulência urbana com os pedestres. Para o olhar adestrado de um turista, tudo indica que haverá ali, na próxima esquina, um acidente grave. Contudo, como num conto da fada, todos foram felizes para sempre.
Moros e Cristianos


     O café da manhã é farto e simples: frutas, sucos, café, leite, pão, manteiga, goiabada pastosa, uma pequena tortilla. O almoço é mais barato nos restaurantes controlados pelo Estado, mas há muitos lugares particulares. Há pratos deliciosos, do arroz com feijão (“moros y cristianos”) à lagosta (Cuba tem fazendas produtoras), passando pela “ropa vieja”, com carne vermelha desfiada. Particularmente, realizei um sonho iniciado na década de 1970: almoçamos no El Conejito, em Havana. Das frutas por nós desconhecidas, gostamos de uma chamada mamoncillo.

     Estivemos em muitos pontos turísticos em Havana, em Santa Clara e na região entre Havana e Piñar del Rio. Vimos muita terra produzindo arroz e milho e fazendas criadoras de camarão, de lagosta e de pescado. Não vimos canaviais por onde passamos. Não vimos fumo, pois é plantado em outros meses.

     Compramos alguns livros e um álbum de figurinhas sobre a Revolução. Compramos lembrancinhas, como bonés, instrumentos musicais. Paramos em Viñales, em uma finca produtora de tabaco. O charuto é produzido artesanalmente. Tivemos a felicidade de acompanharmos o processo inteiro.

     Fizemos uma viagem de ônibus, de Havana a Santa Clara. Dali fomos de carro a Trinidad e voltamos a Havana de ônibus. Passamos por pequenas povoações e por cidades maiores. Em todas elas, algo em comum: Escola Primária, Policlínica e CDR (Comitê de Defesa da Revolução). Conhecemos uma Escola Primária em Trinidad e uma Policlínica em Havana. Conversamos com alguns cidadãos sobre o CDR, entre eles, um ex-guerrilheiro dos tempos de Che, em Santa Clara.

Memorial a Che Guevara
em Santa Clara
      



 Há uma forte consciência política dos efeitos do bloqueio econômico (que vem desde 1962) e da vitória do povo sobre os invasores contrarrevolucionários na Baía dos Porcos. Há consciência dos avanços na educação, na saúde, nos esportes.


     Mas há também um descontentamento com a situação econômica, com a adoção de duas moedas, uma conversível em moeda estrangeira e outra não. Os salários são pagos em CUP (peso não conversível), enquanto o CUC, que vale aproximadamente 26 CUPs, é a moeda conversível.  A Assembleia Nacional está estudando medidas para a reunificação dessas moedas.

     Novas reformas estão sendo colocadas em prática, como a autorização para a compra e venda de automóveis e de residências e o fim da necessidade de autorização para o cubano sair do país. Outra medida modernizadora é a Lei de Investimentos Estrangeiros em Cuba, regulando a entrada de capital externo nos negócios da ilha.




     Um grande investimento está sendo feito pelo BNDES no porto de Mariel, distante 40 quilômetros de Havana e inaugurado em janeiro de 2014. O Brasil consolida-se como o terceiro maior parceiro de Cuba, atrás da Venezuela e da China. Em Mariel, de estrutura similar às zonas especiais da China, o capital externo aplicado pode chegar a 100%. Como os Estados Unidos da América ainda não derrubaram o bloqueio econômico, outras economias mundiais avançam como parceiros das grandes mudanças em curso em Cuba.

     A liberalização da economia não pode ser confundida com liberalização política. O centralismo de Estado continua, com partido único, o Partido Comunista Cubano.


2 comentários:

  1. Saudades, professor Wagner!!!!

    Beeeijos!!!!

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  2. Bela experiência, professor Wagner! Inspiradora e esclarecedora...

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