segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

ONDAS REBELDES



ONDAS REBELDES

     No início de 2011, uma onda rebelde atingiu o mundo árabe. Para onde vai a História? Qual o papel e os interesses das massas populares? E das potências mundiais? E de Israel? Qual o papel do petróleo, ainda fundamental para mover o mundo industrial?
     A crise de 2008 é uma fratura exposta do neoliberalismo. Os agentes econômicos, melhor dizendo, a burguesia, defendem o “Estado Mínimo” e a Lei de Mercado. Mas passaram o chapéu pedindo ao Estado que os salvassem.
     A China continental, mantendo o Estado de partido único criado em 1949, ultrapassa vários Estados capitalistas e torna-se a segunda potência mundial. A continuar assim, o Pacífico poderá se tornar o novo eixo econômico e aéreo, substituindo o Atlântico, como este fez o Mediterrâneo minguar a partir da Revolução Comercial do século XV em diante. O litoral Oeste dos Estados Unidos e o litoral Leste chinês serão a moldura para o possível novo eixo econômico internacional.
     As preocupações ecológicas começam a deixar de ser apenas discurso e, embora timidamente, passam a fazer parte das ações em todo o mundo. Há um novo internacionalismo no ar pois o planeta começa a ser visto como casa de todos, sem fronteiras, sem muros.
     Mulheres assumem papel de liderança, incluindo de governos de vários Estados Nacionais e são aceitas como tal. O racismo, o preconceito, a intolerância, embora sobrevivam, encontram a cada dia mais combatentes nos setores mais avançados das sociedades e dos Estados.
     O WikiLeaks usa a alta tecnologia do sistema para revelar que nem tudo são flores nem liberdade no sistema. A liberdade de imprensa e de pensamento é uma falácia? Só deve ser verdade se defender o sistema?
     Há uma revolução subterrânea e cada vez menos silenciosa pulsando nos bastidores da História e da Geopolítica? Possivelmente os acontecimentos de 2011 no mundo árabe seja a ponta do novelo ainda enrolado. Talvez esteja nascendo um novo mundo, sem totalitarismos, sem ditaduras, sem fundamentalismos.

A ONDA CONSERVADORA DO SÉCULO XIX

     Após a queda de Napoleão Bonaparte, em 1815, as forças de conservação saíram vencedoras no embate contra as forças de transformação. O absolutismo monárquico, fundado no feudalismo, no estamento e na teoria da origem divina do poder, sufocava a onda liberal iniciada pela Revolução Francesa. Era a Restauração, representada diplomaticamente nas reuniões do Congresso de Viena e militarmente pela criação da Santa Aliança, braço armado do Congresso. Os grandes vencedores foram, não por coincidência, os Quatro Grandes da época: Inglaterra, Rússia, Áustria e Prússia. Mas, enquanto os três últimos Estados se ancoravam na legitimidade do passado, olhando o futuro pelo retrovisor da História, a Inglaterra acendia seu farol alto em direção ao capitalismo.
     Se pensarmos com a cabeça da alta burguesia britânica, não há contradição em apoiar a Restauração Absolutista no continente, mantendo seu atraso estrutural e, ao mesmo tempo, condenar a Restauração européia nas nascentes nações latino-americanas.   
     A onda liberal foi transportada para as Américas, ocorrendo a ruptura do pacto colonial ibérico. O monopólio comercial tinha fim, mas não a divisão internacional do trabalho. E a América Latina deixava de ser periferia do comercialismo ibérico e passava a ser periferia do industrialismo britânico.
     Na Europa, o Congresso decidiu repartir a Polônia entre a Prússia, a Áustria e a Rússia. A Bélgica foi entregue à Holanda. A Áustria passou a dominar territórios italianos, como Veneza e Lombardia, e passou a liderar a Confederação Germânica.

A ONDA LIBERAL E NACIONALISTA DE 1820 E 1830



     O liberalismo e o nacionalismo eram, naquele momento, forças de transformação contra a Europa de Metternich do Congresso de Viena. Uma onda rebelde ocorreu em 1820, na Confederação Germânica (futura Alemanha), na Itália (ainda não unificada), na Grécia, em Portugal e na Espanha.
     Em 1830, novas revoltas, na França, na Bélgica, na Polônia, na Alemanha, na Itália, em Portugal e na Espanha. Os fatores comuns eram os ideais liberais e nacionalistas, reprimidos na onda reacionária anterior; crises na produção de alimentos, levando à alta dos preços; falência de fábricas diante da concorrência de produtos ingleses; descontentamento do proletariado diante do desemprego, dos baixos salários e da extensa jornada de trabalho; descontentamento da burguesia em função da crise econômica e da política absolutista que a afastava do poder.
     No caso as França, os Três Dias Gloriosos (27 a 29 de abril), vários setores marginalizados se uniram e derrubaram Carlos X, o último Bourbon. Afastado o rei, a burguesia adiantou-se no processo revolucionário e colocou outro rei no trono, Luís Felipe de Orleans, conhecido por Rei Burguês. Sintomático foi o depoimento de Jacques Lafitte, banqueiro que apoiou o golpe contra Carlos X: “De agora em diante, os banqueiros governarão a França!”

     E a onda de 1830 chegou à Bélgica, liberal, industrial, protecionista, católica, separando-se da Holanda, livre-cambista e protestante. Na Polônia, um levante liberal e nacionalista foi esmagado com violência pelos dominadores russos e austríacos. Em Portugal, os miguelistas absolutistas foram derrotados por D. Pedro IV (D. Pedro I do Brasil), o mesmo ocorrendo com os também absolutistas carlistas da Espanha diante da onda liberal.
http://www.youtube.com/watch?v=xrdl7gqH-cs

A ONDA DE 1848 E A PRIMAVERA DOS POVOS

     Em 1848, entra em cena um novo componente nas ondas revolucionárias, o socialismo. As causas das Revoluções de 1830 não tinham sido superadas e, pelo contrário, se aprofundaram. Pensadores do socialismo utópico, “romântico”, buscavam respostas para os desafios crescentes da crise. Naquele ano, o socialismo científico proposto por Marx e Engels ainda tinha pouca influência, pois o Manifesto Comunista, certidão de nascimento do marxismo acabara de ser publicado.
     Na França, ocorrera um crescimento do capitalismo industrial no governo de Luís Felipe. E a multiplicação das fábricas fazia crescer o número de operários, formando um proletariado significativo, mas alijado do poder pelo critério censitário nas eleições. Por outro lado, a corrupção, o conservadorismo e o autoritarismo da monarquia faziam crescer a opção republicana, os liberais, os bonapartistas, os legitimistas bourbônicos e os socialistas. Para alguns oposicionistas, a luta se esgotava na política. Para outros, era uma luta de classes, para mudar todas as estruturas.
     Luís Felipe passou a reprimir as associações, a imprensa e até o Parlamento. Em fevereiro, as barricadas populares foram o núcleo da Revolução, atraindo outros setores, incluindo a burguesia.
     Derrubado Luís Felipe, formou-se um Governo Provisório, composto por socialistas e por republicanos liberais. Nascia a Segunda República e, com ela, a volta da liberdade de imprensa, a anistia a presos políticos, estabelecido o direito à greve e a criação das Oficinas Nacionais, defendida por Luis Blanc como forma de eliminar o desemprego.
     Mas a burguesia tratou logo de isolar e reprimir os avanços populares e socialistas. Unindo-se a grandes proprietários de terra e à Igreja, venceu as eleições para a Constituinte, usou a força armada contra o povo e consagrou sua vitória ao eleger Luís Napoleão para a Presidência da República.
     Em toda a Europa, estava em curso a Primavera dos Povos. Inspirados nos franceses, a onda rebelde tinha cores liberais e nacionalistas. Na Itália, ressurgem as lutas pela unificação nacional e a disputa entre a liderança monárquica do Piemonte e a liderança republicana de Mazzini e Garibaldi. Na Confederação Germânica, a Prússia industrial tentava fazer nascer uma Alemanha para os alemães. Mais uma vez, a repressão conservadora saiu vitoriosa. Ainda não existia a Itália e a Alemanha.

AS ONDAS DE 1860 E 1870

     Nas décadas de sessenta e setenta do século XIX, ocorreram novas ondas rebeldes, algumas revolucionárias. A Guerra de Secessão manteve a unidade nacional e consolidou o capitalismo nos Estados Unidos. A Revolução Meiji encerrou o tradicionalismo do shogunato e dos daimiôs, em direção ao capitalismo industrial no Japão. As guerras de unificação nacional desembocaram, finalmente, no nascimento da Alemanha (II Reich) e da Itália (Monarquia Constitucional) e no capitalismo industrial nessas novas nações.
     A queda de Napoleão III diante da Prússia foi a conjuntura para o nascimento da Terceira República Francesa e da Comuna de Paris. Esta, de curta duração, foi uma antecipação da revolução proletária. AS ONDAS DE 1930

     Nos anos vinte e trinta do século passado, ocorreram novas ondas rebeldes e de vários matizes. Na América Latina, caíram as oligarquias tradicionais dos caudilhos e coronéis e novas forças modernizadoras chegaram ao poder, definidas, mais tarde, como populistas.   
     Atingidas pela Grande Depressão, as democracias liberais europeias entraram em crise, enquanto crescia a influência soviética. Classes conservadoras, apavoradas com a vitória proletária e camponesa na União Soviética, passaram a apoiar o fascismo, extrema direita anticomunista. A Itália de Mussoline, a Alemanha de Hitler, Portugal de Salazar e a Espanha de Franco são os maiores exemplos.

AS ONDAS DOS ANOS 50 E 60

     Em plena Guerra Fria, uma onda rebelde marcou a descolonização afro-asiática. É emblemática a Guerra do Vietnã, primeiro conflito midiático. Ultrapassou fronteiras e espalhou-se pelo mundo, colaborando decisivamente para os "anos rebeldes", nucleados em 1968.
     Na América Latina, a começar pelo Brasil, a crise do populismo desembocou numa onda de ditaduras militares que perduraram até os anos oitenta.

2 comentários:

  1. Ótimo panorama, Wagner. Assim é possível enxergar até que tais "ondas" adquirem contornos de crises sistêmicas, talvez essenciais para a manutenção do capital nos centros de poder.

    Espero que esteja bem aí pela região zero dezenove.
    Um abraço de sua colega das terras botucatuenses.

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  2. Excelente, parabéns!
    (Pedro de Toledo, 3º ano - Novo Anglo Taquaral)

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