domingo, 19 de junho de 2011

CONEXÃO: RENASCIMENTO CULTURAL E ILUMINISMO

O Renascimento Cultural foi o início de um processo de transformações ideológicas que marcou toda a Idade Moderna, consagrando-se com o Iluminismo. As mudanças infra-estruturais ocorridas na Baixa Idade Média, sintetizadas no nascimento e na ascensão da burguesia exigiam uma adequação superestrutural às novas realidades materiais do nascente capitalismo.
A cultura clássica (greco-romana) foi retomada e atingiu praticamente todos os campos da atividade humana. No dizer de um estudioso, "Nunca uma civilização dera tão grande lugar à pintura e à música, nem erguera ao céu tão altas cúpulas, nem elevara ao nível da alta literatura tantas línguas nacionais encerradas em tão exíguo espaço. Nunca no passado da humanidade tinham surgido tantas invenções em tão pouco tempo. Pois o Renascimento foi, especialmente, progresso técnico; deu ao homem do Ocidente maior domínio sobre um mundo mais bem conhecido. Ensinou-lhe a atravessar os oceanos, a fabricar ferro fundido, a servir-se das armas de fogo, a contar as horas com um motor, a imprimir, a utilizar dia a dia a letra de câmbio e o seguro marítimo". (DELUMEAU, Jean, A Civilização do Renascimento)
Surgido na Itália, o Renascimento propagou-se por toda a Europa. Embora tenha adquirido aspectos diferentes de local para local, tinha uma característica comum: a proposta liderada pelo humanismo de romper com os valores feudais, marcados pela visão teocêntrica e pessimista das realidades que cercam o homem. Os humanistas mergulharam na Antiguidade Clássica, onde bebiam os valores materiais e espirituais do grego e do latim. Vasculharam as bibliotecas os mosteiros e traduziram os clássicos para as línguas nacionais, “vulgares”.
O “Conhece-te a ti mesmo”da filosofia clássica desembocou no estudo da própria individualidade, no autoconhecimento, no mergulho do homem renascentista no interior de si mesmo. Ao espírito coletivista medieval, opunha-se agora o individualismo, adequado à burguesia em ascensão.
Uma boa parte da burguesia, endinheirada pelo comércio e por atividades bancárias, apoiou, incentivou, protegeu e divulgou a produção artística e científica. O mecenato não foi, portanto, exclusivo dos reis, dos papas, dos príncipes; foi também burguês.
Nascia a ciência moderna, alicerçada no racionalismo, no uso exclusivo da razão como meio de se chegar ao conhecimento. Estimulou-se a pesquisa objetiva e o método experimental. As verdades dogmáticas, instituídas, não respondiam mais às indagações de um homem que atravessava oceanos, um homem cada vez mais urbano, que lia livremente textos, inclusive os sagrados, sem interferência do clero. E os textos se multiplivaram a partir da renovação tipográfica de Gutemberg, ampliando o acesso à cultura intelectual. A experiência, “a mãe de todas as coisas”, sepultava o mundo medieval e engravidava o mundo moderno.
O espírito renascentista foi continuado por pensadores dos séculos XVII e XVIII: o cientificismo desembocou no iluminismo, cujos filósofos eram os propagadores da luz e do conhecimento fundados na supremacia da Razão. Assim, o movimento iluminista apresentou como características fundamentais a veneração à ciência, ao empirismo, ao racionalismo, ao antitradicionalismo, ao otimismo utopístico e ao liberalismo econômico.
No início do século XVII morreu Galileu, mas nasceu Newton, seu continuador. E Descartes levantava a tese da Dúvida Metódica, racional, através da qual pode-se chegar à compreensão. A razão leva ao conhecimento, à exaltação do indivíduo como senhor de si mesmo, arauto da liberdade e da igualdade de direitos perante a Lei.
O homem deve ser o sujeito de sua própria História, segundo os iluministas como Kant (1724-1804), para quem a nova filosofia significava “a saída do homem de sua menoridade, de que ele próprio é culpado. Menoridade é a incapacidade de se servir do entendimento sem a orientação de outrem”. O homem opaco, supersticioso, dominado pela Igreja e pelo Estado absolutista, seria superado pelo homem iluminado pela luz da razão.
Evidentemente, o agitar intelectual trazia continuidade de um pensador em relação a outro, mas também havia divergências. Este é o caso de Rousseau, cuja crítica atingiu a própria burguesia e a propriedade privada. Em seu Discurso Sobre a Origem da Desigualdade, afirma: “O primeiro que cercou um terreno, advertindo: “Este é meu”e, encontrando gente muito simples que acreditou, foi o verdadeiro fundador da sociedade civil (...) Tivesse gritado a seus semelhantes: “não escutem esse impostor; vocês estarão perdidos se esquecerem que os frutos são de todos, que a terra não é de ninguém”. Assim, para Rousseau, “a propriedade privada é um mal e é a origem de todos os males”.
Para ele, o individualismo só não se tornará egoísmo e despotismo quando se colocar a vontade geral, justa e soberana acima do indivíduo. A melhor forma para se viver em sociedade é o contrato social.
Ao falar do homem livre, Rousseau o encontra no estado da natureza, “constituído de todos os dons sobrenaturais que ele pode receber e de todas as faculdades artificiais que ele só pode adquirir por meio de progressos muito longos, considerando-o, numa palavra, tal como deve ter saído das mãos da natureza, vejo um animal menos forte do que uns, menos ágil do que outros, mas, em conjunto, organizado de modo mais vantajoso do que todos os demais”. Este homem, o bom selvagem de Rousseau, por viver em estado de natureza, não conhece a propriedade privada e as desigualdades geradas por ela.
Em relação à mulher, ao amor romântico e passional, Rousseau apresenta, em Nova Elisa, uma crítica à razão, deixando triunfar a natureza e o amor. A mulher deixa de ser apenas a sombra do homem, de ser apenas a cuidadora de crianças, seus filhos; passa a ter valor em si mesma, dona de seu destino, de sua história. A publicação assustou tanto os reacionários que a Igreja Católica o inseriu no Index Librorum Pohibitorum.
Para os iluministas, a liberdade e a felicidade não podem ser privadas, vividas de maneira egoísta. Devem ser bens coletivos, sociais. Buscam a sabedoria de negar a infelicidade pura e constante, mas negam o excesso de desejos, que tornariam a felicidade inatingível. A felicidade e a liberdade somente serão atingidas pelo homem iliminado e virtuoso, capaz de equilibrar o desejo com a possibilidade. E a fraternidade é o fiel da balança.
Contudo, por serem movimentos de uma burguesia em ascensão, o Renascimento Cultural e o Iluminismo tinham seus limites: "Na verdade, Ciência e Razâo eram apenas uma face de realidade bem mais complexa. Enquanto as elites redescobriam Aristóteles ou discutiam Platão na Academia florentina, de Lourenço de Médicis, a quase totalidade da populaçâo europeia continuava analfabeta. Praticamente alheia à matematização do tempo, tinha seu trabalho regido ainda por galos e pelos sinos (... ) a vida continuava pautada por ritmos sazonais" , segundo Laura de Mello e Souza. E, como diziam alguns iluministas, “a luz não atingiu as ruas (...) ao povo, o feno e a canga!”

CRONOLOGIA DE APOIO

1492: Colombo chega à América
1543: Copérnico publica sua obra sobre o heliocentrismo
1628: Harvey, médico, publica seus estudos sobre a cinculação sanguínia no corpo humano.
1633: Galileu Galilei escapa de morrer na fogueira da Inquisição ao negar seus estudos, contrários às verdades da Igreja.
1637: Publicação do Discurso Sobre o Método, de Descartes.
1649: decapitação de Carlos I, Stuart, durante a Revolução Puritana, acusado de “destruir os direitos dos homens livres”.
1651: Thomas Hobbes publica o Leviatã. É um geômetra que teoriza o absolutismo e prega a submissão da Igreja ao Estado.
1687: Newton publica sua obra Philosophiae Natualis Principia Mattematica.
1690: Locke publica seu Ensaio Sobre o Entendimento Humano.
1703: Morre Robert Hooke, o inventor do microscópio.
1716: Morre Leibniz, filósofo, cientista, matemático.
1734: Montesquieu lança Causas da Ascensão e da Queda de Roma
1740: Benjamin Huntsman inicia a produção de aço na Inglaterra
1743: nasce Lavoisier, considerado o pai da QuímIca moderna.
1748-1749: David Hume lança Inquirições a Respeito da Natureza Humana e Montesquieu o Espírito das Leis.
1751: Diderot lança o primeiro volume da Enciclopédia.
1757: Os fisiocratas dão início à economia moderna.
1759: Voltaire publica Cândido
1760-62: Rousseau publica o Contrato Social.
1764: Mozart apresenta, aos 8 anos de idade, sua 1ª sinfonia. James Hargreaves apresenta sua fiadeira mecânica na Inglaterra.
1776: Adam Smith publica Pesquisa Sobre a Natureza e as Causas da Riqueza das Nações. A economia torna-se uma ciência.
1777: Primeiro jornal diário em Paris.
1781: Kant publica Crítica da Razão Pura.
1798-1799: Jenner, inventor da vacina, com material extraído de vaca, consegue a antivariólica.
1800: Volta fabrica a primeira pilha.

segunda-feira, 13 de junho de 2011

SOCIALISMO CIENTÍFICO (MARXISMO)

A Revolução Industrial criou novas relações sociais de produção, com a formação de duas classes dialeticamente antagônicas: a burguesia e o proletariado. A primeira é a proprietária dos meios de produção e a segunda é a proprietária da força de trabalho, que é vendida ao capitalista pelo preço do mercado.
A burguesia apropria-se do excedente de produção do trabalhador e o transforma em lucro individual. Quando se diz “sensibilizada” pela Questão Social, toma atitudes no máximo reformistas pois, de fato, não quer alterar as relações mais profundas que causam a Questão Social.
O proletariado, por sua vez, tenta solucionar os problemas que o atingem lutando e formulando outras teorias, algumas apenas reformistas, outras revolucionárias. Fazem parte desse processo o socialismo utópico (Robert Owen, Jacques Fourier, Saint-Simon,), o ludismo (“Ned Ludd”), o fabianismo (Bernard Shaw), o anarquismo (Proudhon, Bakunin, Malatesta, Tolstoi, Kropotkin) e o socialismo científico (Marx e Engels).
Os principais pensadores do socialismo científico são Karl Marx (1818 a 1883) e Friederich Engels (1829 a 1895) e, entre suas obras cabe destacar: Manifesto Comunista (1848), Contribuição à Crítica da Economia Política (1859) e O Capital (1867). Analisando a realidade social concreta, concluíram ser ela dinâmica e dialeticamente contraditória, pois o avanço técnico trazido pela grande indústria permitia um domínio crescente do homem sobre a natureza, possibilitando o progresso e o enriquecimento de alguns homens, enquanto os trabalhadores eram cada vez mais explorados, empobrecidos, alijados dos bens materiais necessários para a vida. Concluíram que, para entender a sociedade e explicar sua evolução, era fundamental estudar os fatores materiais, ou seja, econômicos e técnicos e a forma como os bens eram produzidos.
No processo de produção de bens, os homens estabelecem relações entre si, que são chamadas relações sociais de produção. Essas relações são diferentes nos vários períodos históricos da humanidade. Assim, “o que distingue as épocas econômicas uma das outras não é o que se faz, mas sim como se faz.” No capitalismo, o trabalho humano vem sendo substituído pela máquina, e o trabalhador perde o controle sobre os instrumentos de trabalho e fica absolutamente sujeito ao ritmo, à eficiência e ao tipo de atividade que lhe é imposto por uma máquina, que não é sua propriedade, mas é propriedade privada do burguês. Assim, os proprietários dos meios de produção passam a controlar de forma total e definitiva o processo de produção. A máquina e o que ela significa acabam submetendo totalmente o operário aos donos do capital.
Os marxistas levantam ainda o conceito de forças produtivas, que são a energia com que a sociedade conta para produzir, sendo constituídas de todos os elementos que intervêm na produção material: a força de trabalho e os meios com que se trabalha. As forças produtivas são as forças que resultam da combinação dos elementos do processo de trabalho sob determinadas relações de produção. O seu resultado é uma determinada produtividade do trabalho.
Ocorre que, diferente do trabalho artesanal, em que apenas um indivíduo produzia uma peça inteira, no capitalismo industrial, a divisão técnica do trabalho especializa o trabalhador num determinado setor da produção, e o produto final é o fruto da socialização das forças produtivas. Assim, o produto é o resultado da socialização do trabalho.
Agora podemos entender o que Marx afirmou como sendo a “contradição fundamental do capitalismo”: o caráter cada vez mais social das forças produtivas e a propriedade privada dos meios de produção cada vez mais concentrada. Para o marxismo, ao desenvolver-se a contradição fundamental do sistema capitalista, vão-se criando, cada vez mais, as condições materiais e sociais que permitem sua superação. O crescimento do número de indústrias, a industrialização, o capitalismo “avançado” não se fazem sem aumentar o número de operários e sem concentrá-los dentro de cada fábrica e na sociedade. Os operários criam “consciência de classe”, pois, de fato, constituem uma classe dialeticamente antagônica aos donos dos meios de produção, que se apropriam privadamente das riquezas produzidas socialmente pelas mãos dos operários. Por isso, Marx afirma: “O sistema capitalista cria seus próprios coveiros”. E afirma, ainda, que a união do proletariado fará a verdadeira revolução. Por isso, a famosa frase: “Trabalhadores de todos os países, uni-vos!